O SEGREDO DE MAGDA
Sidney Fernandes
Desde que nasceu, Magda sofria de dermatite de contato, que causava ressecamento e descamação da sua pele. A epiderme se soltava sem qualquer lesão ou trauma. Havia sempre muito sangue em suas vestes e por onde ia soltava pedaços de pele, além do incômodo de se coçar muito.
Por que, ainda no útero materno, surgiu essa síndrome, sem que os médicos tivessem encontrado qualquer herança genética? Se seus ancestrais não tinham genes defeituosos, como Magda contraiu essa doença?
Se não conseguimos encontrar as causas de nossas doenças, dores, deficiências e limitações na atual existência, devemos procurá-la em vida anterior — ensina-nos a Doutrina Espírita.
Voltemos um pouco no tempo.
Entre 1933 e 1945, Magda era a esposa do comandante de um campo de concentração nazista. Por desvio de dinheiro e roubo de bens dos prisioneiros, ela e o marido foram acusados e condenados. Na prisão, depois de sofrer transtornos psicológicos atribuídos às assombrações de prisioneiros que matara e torturara, Magda suicidou-se.
Em seu bilhete final, afirmou:
— Não há outra saída para mim, a morte é a única libertação.
Ao contrário do que pensava, a morte era apenas o início do seu martírio.
***
Depois do suicídio, a maior decepção de Magda foi constatar que não havia morrido. Pensava que iria livrar-se de seus tormentos, de seus perseguidores e de suas culpas com um passe de mágica. Assim que se desligou do corpo físico, foi violentamente envolvida por um turbilhão de centenas de almas, que a esperavam, ansiosas por vingança.
Dores intensas tomaram o seu corpo espiritual, que passou a ser objeto de inúmeras retaliações. Ela sentia como se estivesse sendo esfolada em vida por piranhas ferozes que cortavam sua pele em retalhos. Essa tortura parecia não ter fim e ela acreditava que estivesse no inferno de Dante, descrito em versos pelo poeta florentino.
O que mais a apavorava era julgar que aquela tortura jamais teria fim, que estava entregue às penas eternas. No auge de seus sofrimentos, provocados pelas mordidas e rasgaduras daquelas almas infelizes, de repente um milagre aconteceu. Os verdugos que a dilaceravam impiedosamente assustaram-se e momentaneamente afastaram-se de sua vítima.
Um espírito rodeado de luz aproximou-se e assim se expressou:
— Afastem-se de minha pobre filha, pois a partir de agora eu cuidarei dela.
Magda, sem nada entender, reconheceu a doce voz de sua mãe Mayla naquela sublime entidade que se aproximou e a levou, carinhosamente.
***
Revestidos da ternura do reencontro da mãe com a filha que estava perdida e foi encontrada, os braços maternais de Mayla conchegaram aquela carga preciosa ao seu coração. Do seu tórax partiram chispas de luz que envolveram Magda e lhe deram ligeiro alívio, após longo de tempo de sofrimento.
A emissária partiu, volitando, em direção a instituição socorrista, levando consigo aquele valioso corpo espiritual.
Seis meses mais tarde, graças aos altos créditos de Mayla, intercedidos em favor da filha, Magda dava entrada em um departamento de reencarnação, onde tomou consciência dos bárbaros crimes que cometera em sua recente existência.
Chorou muito, envergonhada e arrependida quando se recordou dos momentos em que havia arrancado a pele tatuada dos prisioneiros — que em seguida eram executados — por sua obcecação em transformar partes de corpos humanos em objetos decorativos.
Chocou-se com a banalização do mal que promovera com crianças indefesas, que eram diabolicamente torturadas, para depois serem separadas de seus pais e levadas para as câmaras de gás.
Fazia sentido, agora, o nome com que as entidades infelizes a chamavam, enquanto a torturavam, logo depois do suicídio:
— Bruxa, bruxa, bruxa... A bruxa do campo de concentração nazista! Era assim que a ela se referiam.
Compreendendo agora o quanto fora cruel e insensível, Magda rogou a Mayla que mais uma vez intercedesse por ela, a fim de renascer em corpo que lhe permitisse filtrar as marcas perispirituais que havia adquirido em sua vida anterior e, ao mesmo tempo, lhe proporcionasse profunda reflexão espiritual que a habilitasse à reparação dos males cometidos.
E a misericórdia divina atendeu suas rogativas. Recebeu um corpo físico com as indeléveis marcas que a sua crueldade havia provocado em centenas de criaturas, por ela trucidadas e mortas. O que, aos olhos humanos poderia significar injustiça divina, nada mais representou do que os reflexos da semeadura infeliz de sua existência anterior.
Por que estamos tratando as agruras de Magda no tempo pretérito? Porque ela sempre encarou com resignação sua doença e até os vinte e cinco anos de idade portou-se de forma exemplar, procurando auxiliar pessoas à sua volta, principalmente crianças carentes. Enquanto familiares e amigos olhavam-na com comiseração, indignados com sua constituição genética, sem justa causa aparente, Magda, em suas convicções mais íntimas, não sabia o porquê de seus sofrimentos, mas tinha consciência de que os merecia.
Esse comportamento sereno deu forças à sua mãe espiritual Mayla para, mais uma vez, interceder por Magda, a fim de minorar os sofrimentos da sua presente vida. O que os tratamentos médicos não conseguiram ela própria conseguiu, ao receber a inspiração de aplicar sobre as chagas flocos de cereais, que aliviaram o ressecamento da pele.
Certa ocasião, surgiu em sua cidade um médium curador. Inspirados por Mayla, Magda foi conduzida por familiares aos seus cuidados. O missionário recebeu-a solícito, disposto a fazer o possível para ajudá-la.
Diante da possibilidade de minorar seus sofrimentos, Magda orou com fervor, buscando mais uma vez a ajuda de sua mãe espiritual, a quem já havia se habituado a tratar como o anjo protetor de sua vida.
O médium de cura se viu cercado de espíritos amorosos, que o inspiraram a impor as mãos sobre as chagas de Magda, das quais saíram invisíveis fagulhas de luz, que abrangeram todos os pontos enfermos da moça. Em breves dias o prodígio estava realizado. Magda se viu livre, muito antes do que esperava, dos pontos sanguinolentos de sua epiderme.
Agradecida, ajoelhou-se diante da compaixão divina e, ali mesmo, renovou seus votos de transformação, decidida a aproveitar a preciosa oportunidade concedida pela misericórdia espiritual.
***
O segredo de Magda havia se perdido na noite dos tempos e ficara entre ela e os mais próximos servidores do Criador.
A bruxa do campo de concentração nazista finalmente se libertara dos seus ignominiosos atos de ódio, covardia, preconceito e crueldade. Renovara-se diante da dor e da preciosa oportunidade que o amor de sua mãe espiritual havia lhe proporcionado. Queimara seu carma negativo e se tornara apóstola defensora de sofredores e desvalidos. Prevalecera o amor, em lugar da dor.
***
Fiquemos com Emmanuel, em Caminho, Verdade e Vida:
Entre os homens, o criminoso é enviado a penas cruéis, seja pela condenação à morte ou aos sofrimentos prolongados. A Providência, todavia, corrige, amando.... Determina somente que os comparsas de dramas nefastos troquem a vestimenta carnal e voltem ao palco da atividade humana, de modo a se redimirem, uns à frente dos outros.