Décadas atrás conheci um grande passista que trabalhava em casa espírita da cidade de Bauru. De suas mãos saíam fagulhas de luz que eram percebidas em forma de elevação de temperatura pelos seus assistidos.
Certa ocasião, depois de submeter-me a passe magnético com ele, diante do bem-estar imediato que ele me proporcionou, agradeci e elogiei sua brilhante faculdade.
— Nem sempre foi assim — disse-me o passista, humildemente.
Como ele não se dispunha a parar sua narrativa, passei a ouvi-lo com muito interesse.
— Eu era fumante e gostava de beber socialmente. Embora nos dias em que aplicava os passes eu me abstivesse, percebi que os fluidos que eu doava não eram exatamente brilhantes e harmoniosos. Revestiam-se de emanações etílicas, de tabaco e nicotina, que alcançavam a laringe, os brônquios e os intestinos perispirituais de meus assistidos.
— Imagine como ficava minha consciência ao ministrar minha carga fluídico-magnética meio opaca sobre uma inocente criancinha. Fico pensando também no trabalho que eu dava aos mentores espirituais encarregados de potencializar minhas forças eivadas de impurezas, que precisavam filtrar, para não atingir o sistema nervoso de meus receptores. No entanto, utilizavam-se de meus préstimos, à falta de melhor instrumento.
— Pensou em desistir de sua tarefa? — perguntei.
— Jamais! Sempre tive consciência de que a alta carga de magnetismo de que sou portador é um investimento da espiritualidade e que poderá ser retirada a qualquer momento, se eu não utilizá-la corretamente.
— Conscientizei-me de que eu estava transmitindo uma espécie de meio-bem. Luzes misturadas com trevas. Tomei, então, uma decisão radical, a fim de limpar meus fluidos, e afastei-me totalmente da bebida e do cigarro. Hoje, felizmente, a situação é bem diferente, a ponto de sensibilizar meus receptores com energias doces e brandas, como aconteceu com você. Tenho, todavia, consciência, de que o bem vem dos espíritos, a quem devo todos os méritos de minhas curas.
Abracei o fiel e consciente trabalhador da seara bendita, certo de que estava diante de autêntico representante da confiança e da tranquilidade.
***
André Luiz nos traz situação bem parecida, quando Letícia, mãe de Gotuzo, médico em serviço na espiritualidade, a ele se dirigiu:
— Gotuzo, meu filho, serei breve.
E passou a lhe fazer sérias advertências:
— Como conduzirá doentes à cura, se prossegue magoado com aqueles que o feriram aparentemente? Como dará lições de bom ânimo aos tristes, se se demora tanto tempo na ilusão do desalento? Ó filho amado, ninguém serve à obra do Pai com a mente toldada pelo vinho amargoso das paixões! Abra o entendimento à passagem das bênçãos divinas! Não guarde vermes destruidores no jardim da esperança. Estragariam as mais belas flores, aniquilando a promessa dos frutos...
***
Entendo, amigo leitor, que a lição que aprendemos com o passista do início deste texto, e as observações da mãe do médico Gotuzo, registradas por André Luiz, servem-nos de aviso para a nossa rotina de vida.
Se queremos efetivamente enveredar pelo caminho da benemerência, temos que aprender a cortar as raízes com o mal que ainda teima em permanecer em nossa personalidade.
Temos que aprender a fazer o bem sem exigências, privilégios, cobranças ou expectativa de gratidão.
Tio querido, ao desencarnar, deixou-me bilhete póstumo, que sua esposa leu para mim:
— Meu filho, persista no bem tendo em conta que, quem se aventura a praticar o amor e a caridade, precisa preparar-se para a ingratidão.
Na verdade, mesmo que inconscientemente, todo cultivador espera resultados da lavoura a que se dedica. Contudo, misturar interesse e fluidos negativos com a luz que pretendemos oferecer é ministrar o que Emmanuel chama de meio-bem, por onde o mal se insinua e envenena as boas obras.
Fiquemos com as sábias palavras de Emmanuel, para nossa reflexão:
— Estrada construída pela metade patrocina acidentes. Víboras penetram em casa, varando brechas. O bem pede doação total para que se realize no mundo o bem de todos. É por isso que a Doutrina Espírita nos esclarece que o bem deve ser praticado com absoluto desinteresse e infatigável devotamento, sem que nos seja lícito, em se tratando de nossa pessoa, reclamar bem algum.
Fontes: Obreiros da Vida Eterna, André Luiz; O Livro da Esperança, Emmanue