Narcisa tentou acalmar o rapaz com distúrbios. Ele gritava, pedindo socorro, por estar sendo perseguido por um monstro. Na verdade, o monstro era o seu próprio cadáver, ao qual ele se apegara. Ficou muitos dias ao lado dos despojos, sem se conformar com a morte. Por fim, os vermes lhe provocaram tamanho padecimento, que ele se afastou do túmulo, tomado de horror.
Este relato, que retiramos do livro Nosso Lar, de André Luiz, retrata a terrível situação de um jovem chamado Francisco, que, na Terra, recusava-se a enfrentar o desconhecido da morte e a desapegar-se das sensações físicas. Achava que iria viver para sempre e estava fechado a qualquer ideia de vida eterna da alma.
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Como morrer bem e evitar a terrível situação de Francisco, descrita por André Luiz?
Alexandre Caldini, autor de A Morte na Visão do Espiritismo, afirma que as pessoas costumam evitar o tema morte. Alegam que está tudo bem, tudo certo e acabam se esquivando e se esquecendo do assunto. Mesmo que alguém venha relembrá-las de que algum dia vão morrer, dizem que esse assunto é mórbido e fazem de conta que os outros morrerão, menos elas.
— Qualquer apego dificulta o nosso desligamento, na hora da morte — continua Caldini. A partir do momento que compreendemos essa realidade, temos condições de partir com tranquilidade, em paz, para a outra vida.
Como aprender a viver bem?
Diz Simonetti:
Espíritos atormentados e infelizes, torturados por indescritíveis padecimentos, ganharam a vida sob o ponto de vista humano; ficaram ricos e famosos; foram ativos nos negócios, nas conquistas amorosas, no empenho por desfrutar das benesses humanas. Perderam a vida, no sentido espiritual. Deixaram de cumprir o que vieram fazer. Regressaram ao Além do mesmo tamanho que aqui chegaram. Não melhoraram nem deixaram o mundo melhor. Passaram em brancas nuvens.
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Tobias caminhava, ao lado de André Luiz, por vastas câmaras de retificação, ligadas entre si e repletas de verdadeiros despojos humanos. Gemidos, soluços e frases dolorosas, deixando transparecer terrível miséria espiritual.
— São contrabandistas na vida eterna — disse Tobias a André.
— Como assim? - atalhou, interessado.
O interlocutor sorriu e respondeu em voz firme:
— Acreditavam que as mercadorias propriamente terrestres teriam o mesmo valor nos planos do Espírito.
— Supunham que o prazer criminoso, o poder do dinheiro, a revolta contra a lei e a imposição dos caprichos atravessariam as fronteiras do túmulo e vigorariam aqui também, oferecendo-lhes ensejos a disparates novos.
— Foram negociantes imprevidentes. Esqueceram de cambiar as posses materiais em créditos espirituais. Não aprenderam as mais simples operações de câmbio no mundo. Quando iam a Londres, trocavam contos de réis por libras esterlinas; entretanto, nem com a certeza matemática da morte carnal se animaram a adquirir os valores da espiritualidade.
— Agora... que fazer? Temos os milionários das sensações físicas transformados em mendigos da alma.
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Acautelemo-nos, amigo leitor, contra as ilusões da matéria. As descrições de além-túmulo são demasiado expressivas para que as ignoremos.
Ninguém está proibido de progredir, ganhar o seu sustento ou amealhar provisões para o futuro. Contudo, a vida espera de nós desapego e cuidado contra a ganância e a ambição desenfreada.
Tenhamos em mente mais uma expressão de Jesus, adequada à nossa reflexão final:
Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á. E quem perder a vida, por minha causa, achá-la-á.
Mateus, 16:25