A Morte, Passo a Passo. - Sidney Fernandes

A MORTE PASSO A PASSO

I

Sidney Fernandes

Não obstante a ternura e a suavidade da criança, por trás da poesia do nascimento está o retorno de uma alma que momentaneamente deixa sua moradia espiritual em busca do progresso e da regeneração. Se tivéssemos consciência de que o regresso à Terra nada mais representa do que um mergulho de um escafandrista na matéria densa, encararíamos a morte como libertação para a vida verdadeira. Pouco lamentaríamos por se tratar, não de uma desgraça causadora de orfandade ou viuvez, mas da libertação de um exílio.

Incrível experiência

Dependendo de como vivemos, o confronto com a hora da verdade significa o rompimento dos grilhões da matéria, que nos possibilita contemplar as realidades do além-túmulo.

Nos primeiros momentos, como é compreensível, o morto se sente aturdido, principalmente quando não se preparou convenientemente para a outra vida. Se, no entanto, teve um mínimo de empenho para se conservar na dignidade, na honradez e no cumprimento dos deveres, em breve estará bem, como ave que deixou a gaiola.

É bom lembrar que sempre será possível contar com o amparo de familiares, amigos e benfeitores que nos antecederam na grande viagem.

Sofrem mais os que ficam?

Os que partem com a consciência tranquila em breve se recuperarão e se readaptarão à nova vida, que nada mais é do que a continuidade do processo evolutivo, momentaneamente modificado com o mergulho na carne. E como ficam parentes, amigos e pessoas queridas?

Os que nunca cogitaram da morte ou evitaram falar dela e adiaram indefinidamente a reflexão sobre o assunto, como se sua hora nunca fosse chegar, com certeza ficarão perplexos, diante de um corpo sem vida, principalmente se ela ocorrer inesperadamente, sem terem tido tempo de se preparar para a separação. Tenderão a perder o controle, a serenidade e o equilíbrio.

Curiosamente, os que se deixam levar pelo desespero e pela revolta, causam estranheza ao falecido, que geralmente encontra situação bem mais confortável do que aquela em vida, pois na nova condição não há dores, apreensões materiais ou ingente preocupação com a sobrevivência. Por que choram os que ficaram se o falecido se encontra bem, leve e em situação muito mais agradável do que desfrutava em vida?

As reações desesperadas das criaturas ligadas ao morto, além de surpresa, costumam também lhe causar perturbação, pois passa a reviver os momentos infelizes por elas evocados. Nessas horas, as crenças bem vividas, a resignação trazida pela oração e a fé na sobrevivência da alma passam a ter fundamental importância, pois são valiosos elementos de sustentação emocional.

Preparemo-nos sempre para a nossa morte e a eventual partida abrupta de nossos entes queridos, na certeza de que, mais cedo ou mais tarde, estaremos nos campos da imortalidade.

 

Nota do autor: Esta série de artigos tem como base o texto do CD “Quem tem medo da morte? ”, gravado por Richard Simonetti e Sidney Fernandes.