A Alma e o Invisível - Sidney Fernandes

A ALMA E O INVISÍVEL
Sidney Fernandes


Desde que o homem atingiu o princípio da racionalidade, a maior descoberta que fez sobre si mesmo foi a de que possui, além do corpo físico, um duplo espiritual, ou seja, todos somos dotados de alma.
Tão importante quanto admitir a existência da alma foi constatar sua individualidade, características próprias diferentes do corpo físico e compreender que se pode atribuir a ela alegria ou sofrimento.
Depois da morte
Para onde vai a alma depois da morte? Dizer que ela vai para baixo (suposto inferno) ou para cima (suposto céu) seria, pretensiosamente, situá-la geograficamente na infinitude do universo, onde desaparecem as coordenadas, ainda que fôssemos dotados de um miraculoso GPS.
Em vez disso, dizer que as almas se situarão no todo invisível no meio do qual vivemos e levarão sua felicidade ou infelicidade em si mesmas; que seus destinos estão subordinados aos respectivos estados morais; e que elas se reunirão a outras almas simpáticas e afins, de acordo com seu grau de depuração, não seria utilizar linguagem mais convincente e acessível à razão humana? Convenhamos que esse raciocínio é muito mais útil e atraente do que o da felicidade da contemplação e da inutilidade perpétua.
Ainda na sequência desse pensamento, não seria muito mais fácil aceitar que os chamados demônios nada mais são do que almas não depuradas, cujos destinos não estão inapelavelmente perdidos, e que poderão chegar, como as outras, à mais elevada perfeição?
Não nos diz o bom senso que essa tese é muito mais  defensável e de acordo com a justiça e a bondade de Deus, do que a doutrina de seres criados para o mal e eternamente voltados para o mal?
Salva-nos o Espiritismo, luz que clareia os caminhos e traz, com lógica e raciocínio incontestáveis, ampla visão das finalidades da vida física e dos caminhos que percorreremos após a morte. Da mesma forma, a Doutrina Espírita rege os contatos entre nós, que ora vivemos do lado de cá, com os outros, que vivem do lado de lá da existência.
Intercâmbio com os espíritos O homem é simplesmente um espírito aprisionado num corpo. Por que motivo um espírito livre da carcaça física não poderia se comunicar conosco, assim como visitamos os prisioneiros da Terra? Não é compreensível que um ente querido, que nos amou e continua nos amando, cuja morada atual é a espiritualidade, queira se comunicar conosco, desde que haja permissão dos superiores e meios adequados para isso?
O intercâmbio entre o plano material e o plano espiritual surgiu com o Espiritismo? Negativo! Allan Kardec ordenou as informações que vieram dos espíritos, catalogou-as e editou as cinco obras básicas que consubstanciam o corpo teórico da Doutrina Espírita. A mediunidade existe desde o início da razão humana.
Registros históricos
O amigo invisível de Sócrates, o encontro de Bruto com seus perseguidores desencarnados, as aparições de Pausânias, no templo de Minerva, os maus presságios de Agripina e Otávia, anunciando a queda de Nero, e os espíritos vingativos que eramvistos ao lado dos restos mortais de Calígula, nos jardins de Lâmia.... Estas são algumas das citações do escorço histórico sobre a mediunidade traçado por Emmanuel, em uma das obras de André Luiz.
Mediunidade e Evangelho
É justamente no Cristianismo nascente que a mediunidade atinge pontos mais expressivos na história da humanidade. Vários discípulos se converteram em autênticos médiuns da Antiguidade.
Comecemos com a cerimônia do Pentecostes, festa dos judeus em memória do dia em que Moisés recebeu as tábuas da Lei. Nessa data, os emissários do Senhor produziram fenômenos físicos, com sinais luminosos e vozes diretas, fenômenos de psicofonia e de xenoglossia, utilizando-se dos dons mediúnicos dos discípulos. Ensinamentos do Evangelho foram veiculados em várias línguas Atos, 2:1-13.
Quando os apóstolos de Jesus foram presos, a Bíblia nos relata a presença de espíritos do Senhor que se materializaram e os libertaram do cárcere injusto Atos, 5:18-20.
Curas pelo olhar
Um homem olhou para os apóstolos Pedro e João, talvez esperando receber deles alguma ajuda, pois era inválido e não
conseguia andar.
Depois de ambos olharem significativamente para o deficiente, Pedro disse:
— Não tenho prata, nem ouro, mas o que tenho, lhe dou, em nome de Jesus Cristo, o nazareno: Ande!
Essas palavras foram acompanhadas do magnetismo curativo que era praticado sistematicamente com o olhar Atos, 3:4-6.
Curas pelas mãos Curas também eram praticadas com a imposição de mãos.
Depois do encontro com Jesus, na estrada de Damasco, Saulo foi procurado por Ananias, que pôs sobre ele as mãos, dizendo:
— Irmão Saulo, o Senhor Jesus, que apareceu no caminho por onde você vinha, enviou-me para que você volte a ver e seja cheio do Espírito Santo Atos, 9:17.
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Assim como hoje são realizadas sessões espíritas de esclarecimento de espíritos obsessores, à época de Jesus, os apóstolos, que eram dotados de grande poder mediúnico, também conseguiam libertar criaturas perseguidas espiritualmente. Além disso, muitos paralíticos e mancos eram curados Atos, 8:7.
Saulo, Saulo, por que me persegues?
Um dos fenômenos mediúnicos mais expressivos da história evangélica foi a faculdade da clarividência, o momento em que Paulo de Tarso viu Jesus, às portas de Damasco. A narrativa é surpreendente, pois descreve um resplendor de luz do céu, em plena luz do dia. Além disso, também a audição — faculdade mediúnica que permite captar sons e vozes do plano espiritual —, quando ele ouve claramente a voz de Jesus:
— Saulo, Saulo, por que me persegues?
A partir desse momento, o teimoso Saulo, diante da cegueira que o acometeu, somente conseguiu dizer:
— Quem és, Senhor?
E falou Jesus:
— Eu sou Jesus, a quem tu persegues.
Tremendo e atônito, disse Saulo:
— Senhor, que queres que eu faça?
A partir daí ele recolheu as instruções do Mestre e entrou na cidade de Damasco Atos, 9:3-8.
Saulo era um homem corajoso. Não obstante, após o choque traumático do encontro com Jesus, ele se sentiu desarvorado e experimentou grande abalo moral. Condoído, o Mestre apresentou-se para Ananias, em extraordinária visão espiritual, e lhe pediu que socorresse Saulo:
— Ananias!
— Eis-me aqui, Senhor — respondeu.
— Vá à casa de Judas, na rua chamada Direita, e pergunte por um homem de Tarso, chamado Saulo Atos, 9:10-11.
Ananias estranhou aquele pedido, pois sabia que Saulo havia ido a Damasco para prender todos os que invocavam o nome de Jesus.
Foi então que o Divino Mestre proferiu as célebres palavras que definiram para sempre a missão de Saulo. A partir da sua conversão, ele se tornaria o gigante Paulo de Tarso, o apóstolo:
— Vai, porque este é para mim um vaso escolhido, para levar o nome diante dos gentios, e dos reis e dos filhos de Israel Atos, 9:13-15.
O caso da senhorita Clairon Um homem se viu perdido de paixão pela Senhorita Clairon, tão notável por sua beleza, quanto por seu talento, quer como cantora, quer como atriz trágica. Quando ela percebeu que o assédio desse homem se tornara inoportuno e havia ultrapassado
os limites da amizade, rompeu qualquer relacionamento. A mágoa que ele sentiu causou-lhe longa enfermidade. Em seu leito de morte, quando soube que a artista não iria vê-lo, esse homem proferiu estas terríveis palavras:
— Desalmada! Persegui-la-ei depois de morto, tanto quanto a persegui em vida!
E isso realmente aconteceu. Durante dois anos e meio depois da morte do pobre coitado, Clairon passou a ouvir repetidos sons, testemunhados por outras pessoas e até por autoridades policiais. Eram gritos agudos, tiros de fuzil, bater de palmas e sons melodiosos, que a perseguiam por onde fosse.
Allan Kardec, ao analisar o caso, classificou-o, conhecendo as manifestações espíritas, de surpreendente e provável, denominando-o de pneumatofonia ou fenômeno de voz direta.
Assim como os espíritos podem produzir, espontaneamente, barulhos e pancadas, também são capazes de fazer com que sejam ouvidos sons, vozes e até estampidos.
A desventura da senhorita Clairon foi se amenizando à medida que o espírito foi readquirindo o domínio de si, finalizando suas manifestações com aplausos e doce melodia à guisa de despedida Revista Espírita 1858.
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Assim também aconteceu no lar dos cristãos em que estavam vários profetas e doutores, instrumentos medianímicos
que favoreceram a produção de fenômenos de voz direta, isto é, sem a utilização de intermediários. Espíritos manifestaram-se
espontaneamente, em alto e bom som:
— Apartai-me a Barnabé e a Saulo, para a obra a que os tenho chamado Atos, 13:2.
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Todos os espíritos podem se tornar visíveis, nem sempre, porém têm permissão ou vontade. Aparecem para se lamentar, provar que estão por perto, dar conselhos ou mesmo para pedir ajuda.
Foi exatamente para pedir o concurso fraterno de Paulo, o apóstolo, que lhe apareceu a figura de um homem assim suplicando:
— Passa à Macedônia, e ajuda-nos.
E logo depois dessa visão, procurou partir para a Macedônia, concluindo que o Senhor os chamava para lá anunciar o Evangelho Atos, 16:9:10.
Emmanuel
Concitando-nos ao estudo da mediunidade, Emmanuel cita ainda os fenômenos ocorridos com Francisco de Assis, as visões de Lutero, os admiráveis desdobramentos de Teresa d’Ávila, as levitações de José de Copertino diante da espantada observação do Papa Urbano VIII e as anotações efetuadas por Emanuel Swedenborg diretamente no plano espiritual.
André Luiz e a mediunidade André Luiz dá sequência ao seu esforço de consolo, restauração, medicação e alimento para nossas almas,
desenvolvido nos livros da coleção A vida no mundo espiritual, com preciosos estudos sobre a mediunidade por intermédio das obras Nos domínios da mediunidade e Mecanismos da mediunidade.
Elas desdobram os minuciosos conceitos teóricos de O Livro dos Médiuns, de Allan Kardec, com a explicação espírita da mediunidade, com o corpo de ideias que apresentam.
— A mediunidade — ensina André Luiz — à luz da Doutrina Espírita, revive a Doutrina de Jesus, no reconhecimento de que não basta a observação dos fatos em si, mas também que se fazem indispensáveis a disciplina e a iluminação dos ingredientes morais que os constituem, a fim de que se tornem fatores de aprimoramento e felicidade, a benefício da criatura em trânsito para a realidade maior (Mecanismos da mediunidade, de André Luiz).
Espiritismo: o porto seguro 

Não raramente se apresentam, nos centros espíritas, pessoas com mudança repentina de humor, desentendimentos injustificáveis, ideias absurdas sem origem definida, doenças que aparecem e desaparecem sem razão de ser, visões e sons misteriosos e aparições que vêm e que vão, que podem ser considerados, depois de constatada sua veracidade, fatos de origem mediúnica.
A lógica irretorquível do Espiritismo proporciona calma, segurança e fortalece a convicção na existência de forças que nos circundam e nos influenciam, para o bem, ou para o mal, dependendo de nossos procedimentos.
Ela nos dá certeza da reação do universo ao modo como conduzimos as nossas vidas. A Doutrina Espírita é o porto seguro para o seguro diagnóstico da sensibilidade mediúnica.
Estudemo-la!
Referências: O Livro dos Médiuns e Revista Espírita de fevereiro de 1858, Allan Kardec; Mediunidade, tudo o que você precisa saber, Richard Simonetti; Mecanismos da mediunidade, André Luiz e Atos dos Apóstolos.