Crer demais ou Crer de menos ? -Sidney Fernandes

CRER DEMAIS OU CRER DE MENOS?
Sidney Fernandes

Com o tempo, quem se familiariza com a Doutrina Espírita começa a achar que a simples convivência com as revelações das verdades além da vida nos habilita a até desejar a morte. Não estou falando de suicídio, mas da equivocada conclusão de que as mazelas terrestres estão ficando tão graves, que o lado de lá pode ser muito melhor.
Irmão Jacó, no livro Voltei, achava que tudo lhe parecia muito simples. Após o desencarne, seu Espírito estaria liberto para prosseguir sua viagem evolutiva, para mundos felizes ou, de volta, em nova encarnação na Terra.
Não contava ele com o fato de que, mesmo com o extraordinário apoio logístico que nos presta o Espiritismo, ainda  assim não temos a exata ideia do que seja a realidade, além-túmulo.
Narra-nos ainda, o autor de Voltei, que a morte nos reconduz à intimidade do lar interior. E se não tivemos o cuidado de guardar ali as determinações divinas, gastaremos muito tempo na limpeza, no reajustamento e na iluminação, em longa introspecção.
Encerra o bondoso Jacó, que se prestou a nos trazer precioso aviso-prévio, para que não incorramos em seus mesmos enganos, quando chegar a nossa hora, como verdadeiro atalaia, agora em privilegiada posição espiritual, incisivamente:
— Não se acreditem quitados com a Lei, por haverem atendido a pequeninos deveres de solidariedade humana, nem se suponham habilitados ao paraíso, por receberem a manifesta proteção de um amigo espiritual! Espiritismo não é somente a graça recebida, é também a necessidade de nos espiritualizarmos para as esferas superiores. Guardem a certeza de que o Evangelho de Nosso Senhor Jesus-Cristo não é apenas um conjunto brilhante de ensinamentos sublimes para ser comentado em nossas doutrinações – é Código da Sabedoria Celestial, cujos dispositivos não podemos confundir.
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Por outro lado, se podemos enveredar por irremediáveis enganos por crermos demais, há os que agem como se fossem eternos, pisando sobre desarvorados e carentes para alcançar seus objetivos a qualquer preço, ressuscitando a sanha materialista do século XIX, por crerem de menos.
A ideia do inferno, com as suas fornalhas ardentes, com as suas caldeiras a ferver, pôde ser tolerada, isto é, perdoável num século de ferro; porém, nos tempos atuais, não passa de vão fantasma, próprio, quando muito, para amedrontar criancinhas e em que estas, crescendo um pouco, logo deixam de crer. Se persistirdes nessa mitologia aterradora, engendrareis a incredulidade, mãe de toda a desorganização social.
Paulo, o apóstolo, O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec
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Tanto para nós:
— que já nos julgamos salvos — porque ostentamos o crachá, o galardão ou salvo-conduto, ou qualquer outro título preferido pelo amigo leitor, recebido a título de reconhecimento pelos serviços prestados durante a presente existência;
— como para os que não estão nem aí para o futuro depois da morte, somente preocupados com o aqui e agora, assumindo postura eminentemente materialista;
Julgamos útil apresentar oportuno testemunho de privilegiado observador da espiritualidade que, a exemplo de Irmão Jacó, nos traz seu alerta.
Dirá o amigo leitor que se trata de mais uma psicografia dos carolas do além, falando o mesmo de sempre, querendo nos converter para o bem.
Aos incrédulos ou impenitentes de plantão, poderíamos parafrasear, com Allan Kardec, em O Espiritismo em sua expressão mais simples:
Uma coisa, é ter um vago pensamento, dissimulado na incerteza e, outra, bem diferente, é a explicação lógica, o conhecimento completo da natureza dos Espíritos e a revelação segura do futuro do homem que o Espiritismo traz com fatos, testemunhos irrecusáveis e o verdadeiro sentido de verdades mal interpretadas.
Atentemos para a comunicação deste Espírito:
CARTA DE UM OBSERVADOR
Amigos da Terra.
Como vocês, quando eu estava aí, encarnado, tomei conhecimento de todas as explicações contidas no Espiritismo lendo as obras básicas e os demais livros complementares, principalmente as que descreviam a espiritualidade.
Fui alertado inúmeras vezes sobre o processo de expurgo que já se iniciou no planeta Terra, visando povoá-la apenas de Espíritos bons. Vim para cá plenamente consciente do processo de exclusão de que estão sendo objetos os causadores de perturbação e confusão, cuja presença, no nosso orbe, representaria obstáculo ao progresso em direção à nova ordem.
Fiei-me na promessa de que alguns seriam poupados, na certeza de que eu me incluiria na exceção dos que foram tragados pelas circunstâncias e pelos maus exemplos. Enganei-me redondamente ao pensar que esse processo seria rápido e automático. Estou sob observação e não estou vendo muitas perspectivas de voltar a encarnar no planeta Terra.
A transição planetária também está acontecendo aqui e há filas de Espíritos querendo uma última chance de viver em um mundo regenerado.
Uma coisa foi eu ouvir e ver de longe esses alertas muito bem elaborados por Espíritos superiores, por intermédio de seus mensageiros, como Allan Kardec e os que o seguiram.
Outra coisa, bem diferente, foi eu chegar aqui e, somente agora, valorizar a vida de encarnado. Sem os desgastes de minhas arestas na última encarnação, com parcial abatimento de meus carmas, eu já teria sido encaminhado sem mais delongas para algum mundo primitivo.
Tenho presenciado, na equipe em estou engajado, inúmeras prestações de contas dos que chegam a estas paragens e constato,  com tristeza e temor, grande parte sendo avisada de que farão parte de mundos mais atrasados que a Terra.
Escrevo-lhes para que se previnam e não apenas pareçam bons. É preciso abandonar a velha hipocrisia. Parecer e não ser replica as lamentáveis experiências dos que viviam perto da religião, sem vivenciá-la, cultivando mentiras e participando, somente sob o aspecto formal, de atividades religiosas.
Antes de serem contagiados pelo vírus do convencimento, da hipocrisia ou do materialismo, melhor se vacinarem contra a desilusão e a decepção, voltando à velha prancheta dos princípios fundamentais de Jesus e de Allan Kardec.
Ali, de volta ao banco escolar dos primeiros ensinamentos, vocês encontrarão o antídoto capaz de salvá-los de síndromes indesejáveis.
Desejo-lhes paz e auguro-lhes bom retorno à pátria espiritual, sem lhes garantir, todavia, qualquer certeza de boa acolhida.
Seu irmão em Cristo.
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Então? Você que me lê, está ainda propenso a percorrer os obscuros corredores da morte sem os devidos preparativos recomendados por Irmão Jacó? Ou a materialidade predominante encantou de tal forma os seus sentidos a ponto de torná-lo indiferente aos perigos da grande viagem?
Não trata de crermos demais ou de menos, e sim de nos conscientizarmos de que a colheita que nos espera depende da lavoura que estamos semeando.
Termino aqui, prezado leitor, minhas observações, confessando-lhe que este escritor não se sente nem um pouco à vontade diante dos sombrios prognósticos do Espírito missivista.
Melhor colocarmos nossas barbas de molho, aproveitando a lucidez dos esclarecimentos espíritas, para nos prepararmos adequadamente para a viagem de volta.
Eventuais surpresas desagradáveis, se ocorrerem, não o serão por falta de aviso.