EM NOME DO SENHOR
-Sidney Fernandes
Se pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei. João, 14:13-14
A palavra do mentor João, de nossa reunião mediúnica semanal, era clara. Muito clara!
— As benesses recebidas do Alto não podem ser egoisticamente guardadas exclusivamente para garantia de sua estabilidade. É tempo de espalharem as emanações magnéticas que trazemos, em benefício de outros que sofrem. Os leitos de dor esperam ansiosamente pela boa vontade de vocês.
Terminada a reunião, fizemos uma coletiva reflexão sobre a comunicação da noite. Estávamos sendo convocados ao trabalho.
Já tínhamos discernimento e preparo para isso.
O corpo diretivo do hospital municipal nos recebeu de braços abertos. O corpo clínico, embalado pela onda que a mídia havia destacado em torno dos tratamentos magnéticos, concordava na aplicação dos chamados toques terapêuticos, agora aceitos em universidades, hospitais, casas de saúde e de recuperação, em mais de 80 países, que se aproximam muito do johrei, dos messiânicos, do reiki, dos japoneses e do passe
espírita.
Foi assim que surgiram os chamados verdinhos, nome carinhoso com que os pacientes passaram a chamar os voluntários que ali passaram a prestar serviço, semanalmente, por causa da cor de seus jalecos.
Embora coordenado por uma entidade espírita, irmãos de outras crenças e filosofias engrossaram as fileiras verdinhas.
Assim, num esforço ecumênico, organizaram-se três turmas diárias, cedo, tarde e noite, de forma que cada voluntário comparecia uma vez por semana para dar o seu plantão.
O episódio a seguir aconteceu numa das manhãs em que, infelizmente, contávamos com apenas dois voluntários, pois quatro elementos da equipe tiveram compromissos familiares e profissionais inadiáveis.
A solução foi manter o fiel Zeca Lopes na retaguarda - ele que atravessava a cidade do distante bairro em que morava e, religiosamente, fazia o melhor café da região a partir das 6 horas da manhã -, cuidando da casinha de apoio, e deixar para mim a aplicação dos passes em todos os doentes.
Foi quando surgiu nosso coordenador, Carlos Alberto, com um novo voluntário. Ciente das nossas dificuldades daquele dia, já que previamente avisado das ausências dos demais componentes da equipe, apresentou-nos um senhor de meia-idade, de nome Osvaldo, que poderia me acompanhar na aplicação dos passes.
Começamos pela infectologia, onde ficam os casos mais graves e, às vezes, com isolamento, que nos impede a proximidade.
— Que os médicos da espiritualidade maior possam trazer alívio a este irmão - orava eu, em voz alta, enquanto percorria, com minhas mãos espalmadas, todo o corpo do doente, sem tocálo.
— Que os bons Espíritos possam trazer o alívio e principalmente a consciência de que Deus sempre faz o melhor por nós - finalizei.
Passamos para outro quarto e nova aplicação:
— Que o Espírito Santo possa abençoar este irmão...- e passamos para novo quarto.
— Em nome de Jesus pedimos as bênçãos de Deus e que todas as coisas ruins possam ser afastadas.
E fomos assim, de quarto em quarto, até finalizarmos todo o atendimento. Ao sairmos do recinto, Osvaldo, que parecia estar meio inquieto e curioso, interpelou-me:
— Estranhei o seu linguajar na aplicação de alguns passes.
Que história é essa de "Espírito Santo" e "em nome de Jesus"?
Essa terminologia não é espírita.
— Eu sei. - tentei explicar ao novato - — Acontece que nossos pacientes são originários de várias denominações religiosas. E não nos cabe aqui ferir qualquer tipo de convicção.
— No início de meu voluntariado enfrentei sérias restrições de pacientes católicos e evangélicos, que recusavam nossas orações. Com o tempo, simplesmente passei a aplicar Kardec.
— Kardec? Como assim? - voltou a indagar Osvaldo.
— Sim, Kardec. Ele não nos alerta quanto à necessidade do trabalho, da solidariedade e da tolerância? Pois bem! Uma pitada de tolerância religiosa respeita as convicções dos doentes e eles recebem melhor nossas orações.
— Afinal de contas, completei - as expressões "Espírito Santo" e "em nome de Jesus", na essência, fazem parte da mensagem do mentor maior que é o Cristo. E se estamos com ele, quem estará contra nós? - encerrei nossa conversa parafraseando a célebre expressão de Paulo, o grande apóstolo.
-x-
O respeito às crenças alheias é dever inatacável. E se pudermos auxiliar as pessoas de nosso relacionamento, que nem sempre comungam de nossas convicções religiosas, sem ferir a pureza doutrinária espírita, por que não fazê-lo? Não faria o mesmo Jesus em meu lugar?