PEDIDOS PARA O ALÉM
- Sidney Fernandes
Comentar situação descrita no livro VIOLETAS NA JANELA, em que a personagem se incomoda com os pedidos feitos por encarnados para uma jovem desencarnada. Após uma pausa, foi a vez de Isa falar.
— Desencarnei por um tumor maligno no cérebro, depois de alguns meses doente. Estava com dezesseis anos. Seguia uma religião que equivocadamente me ensinou que, com a morte, adormecia para acordar no julgamento de toda a humanidade, nos fins dos tempos.
Senti um torpor com a morte do meu corpo, uma espécie de sono, no qual achava que dormia, mas ao mesmo tempo via e ouvia tudo, embora sem muita clareza, o que se passava ao meu redor.
Fiquei junto dos familiares a velar meu corpo. O desespero dos meus foi grande, gritavam, choravam, sofriam horrivelmente. Sentia muita perturbação, mas também sentia-me amparada, escutava alguém convidando para ir, partir.
Os meus familiares me seguravam e não me esforcei para ir, não queria deixá-los sofrendo tanto. Após meu corpo ter sido enterrado, meus familiares foram embora, chamei com fé: “Meu Deus, ajuda-me!” Socorristas me levaram para um Posto de Socorro tentaram explicar e me curar. A doença, o reflexo dela, ainda era forte em mim.
Não me apavorei ao saber que meu corpo morreu, decepcionei-me por não ser como pensava, como acreditava. Entendi as explicações que gentilmente os benfeitores me transmitiam, raciocinando, achei justas e lógicas. Não temi mais, e passei a dormir com mais tranquilidade. Mas os lamentos, o desespero dos meus, enlouqueciam-me. Julgava-me tão coitada por ter morrido que comecei a ter dó de mim, e a autopiedade não leva a nada, só maltrata, desesperei.
Eles começavam a chorar, eu também desesperava e chorava. Quando me chamavam, queria ir para perto deles e acabei indo. Que agonia! Choravam, lamentava, era como se eu tivesse acabado. Sem entender, pois novamente fiquei confusa, sofri muito. Diziam que estava dormindo, que nada via ou sentia, gritava que não e novamente me apavorei, temi adormecer.
Detestei ficar no meu ex-lar, quis voltar ao Posto de Socorro, mas não sabia como. Lembrei de Jovina, uma caridosa enfermeira que cuidou de mim, chamei por ela. Jovina carinhosamente veio em minha ajuda, senti alívio ao vêla. — Jovina, socorre-me! Implorei em lágrimas. — Tira-me daqui, me leva para um lugar onde não possa voltar mais. Jovina me levou para uma Colônia, onde fui internada no hospital do Educandário na ala para jovens. Tive de receber um tratamento especial para superar e entender o desespero dos meus pais, procurando não dar importância aos seus chamados para não sentir tanto. Os orientadores do Educandário, para que pudesse me recuperar mais rápido, tentavam ajudar mais pais. Como o sofrimento leva muitas pessoas a procurar ajuda, meus familiares aceitaram conversar com uma vizinha Espírita que bondosamente lhes explicou que deveriam conformar-se com a vontade de Deus e que eu, sendo boa, deveria estar em bom lugar e que não deveriam me chamar. Foram ótimos conselhos, que entenderam de modo confuso.
Mas, para meu alívio, melhoraram, não chamaram mais por mim e não desesperaram, sofrendo menos. Pude então me sentir mais aliviada, esforcei-me para sarar, porque eles, pensando em mim como doente, com dores, me transmitiam isto, dificultando o desligamento dos reflexos da doença. Sarei e senti-me bem. Comecei a interessar-me em conhecer o Educandário, a Colônia, a fazer amizade e apareceu outro problema. Julgavam-me santa, anjo, e encheram-me de pedidos. Pediram-me de tudo, para ir bem na prova da escola, para ter saúde, para não chover, ou para chover, sarar da dor de cabeça, achar objetos perdidos, etc.
Pior que incentivaram todos os familiares, amigos e vizinhos a fazê-lo. Sentia estes pedidos e agoniava, queria ajudá-los, mas como fazê-lo? Instrutores do Educandário tentaram novamente ajudá-los para que eu melhorasse. Novamente a vizinha Espírita foi a porta voz, conversou com eles, orientou-os para que não pedissem nada a mim. Que pedissem a Deus, a Jesus, aos Anjos. Que eu, sendo boa, deveria estar em bom lugar, mas que talvez não me fosse possível ajudá-los e que sentiria por isto. Ficaram sentidos com a bondosa vizinha. Generosos instrutores do Educandário tentaram novamente esclarecê-los, desligando-os do corpo enquanto dormiam e conversando com eles. Foram aos poucos deixando, mas, ainda hoje, recebo pedidos. Amo meus familiares, desejo-lhes bem, oro por eles, mas não gosto nem de ir visitá-los. Sofri muito com a falta de compreensão deles. A morte é tão natural, não sei por que fazer dela uma tragédia.
Demorei muito tempo internada no Hospital, tive depois que fazer um acompanhamento com orientadores, até me sentir segura. Amo a vida desencarnada, sinto-me tão bem no Educandário. Mas não foi fácil! A conversa continuou agradável por mais tempo, depois nossas visitantes despediram-se e foram embora. Fiquei a pensar...