Os Tempos são chegados? Sidney Fernandes –

Os tempos são chegados?
Sidney Fernandes –


A geração futura, desembaraçada das escórias do velho mundo e formada por
elementos mais depurados, se encontrará animada de ideias e de sentimentos muito
diferentes dos da geração presente, que se vai a passos de gigante.
Allan Kardec, A Gênese


No dia 28 de outubro de 1989, o tradicional jornal O Estadão estampou o seguinte título, em sua coluna de comportamento: Tese analisa obra mediúnica.
A reportagem abordou a corajosa atitude de uma mulher, a mestranda Thaís Montenegro Chinellato, que apresentou como tese de seus estudos de pós-graduação os escritos mediúnicos atribuídos ao poeta inglês John Wilmot Rochester.
Do dia para a noite a obra psicografada por Wera Krijanowsky saltou das obscuras prateleiras dos livros espíritas para o alto do palco da USP, uma das maiores universidades do Brasil.
Numa época em que a banca examinadora da Universidade de São Paulo era composta por ortodoxos luminares, distantes dos livros isolados pela crítica e dos manuais de literatura, aceitar um tema ligado à psicografia teria sido motivo de chacota, não fosse o compromisso da mestranda em ater-se somente ao espírito literário da obra do festejado poeta inglês, sem entrar no mérito do fenômeno medianímico.
De toda forma, a experiência rendeu a credibilidade do meio acadêmico à lavra de Rochester (1647-1680), um verdadeiro atestado público de autenticidade da obra mediúnica, mais de três séculos depois da sua morte. Acrescente-se que a tese da mestranda foi apresentada na ECA – Escola de Comunicações e Artes, tendo recebido a nota máxima, com louvor, pela exigente e tradicional banca examinadora.
***
É a um desses períodos de transformação, ou, se preferirem, de crescimento moral, que a humanidade chegou. Da adolescência ela passa à idade viril. O passado já não é suficiente às suas novas aspirações, às suas novas necessidades; ela não pode mais ser conduzida pelos mesmos meios; ela não se contenta mais com ilusões e artifícios; faltam, à sua razão amadurecida, alimentos mais substanciosos.
Allan Kardec, A Gênese Quase trinta anos depois, estamos atestando uma outra atitude determinada e corajosa, novamente provinda de uma
mulher. A diplomata e pesquisadora Simoni Privato Goidanich, por solicitação de Gustavo Martinéz, presidente da Confederación
Espiritista Argentina, passou a investigar o conteúdo de um artigo do biógrafo Henri Sausse, amigo de Léon Denis e de Gabriel Delanne.
Nesse artigo, Sausse levantou a possibilidade de que, a partir da quinta edição do livro A Gênese, ocorrida três anos depois do desencarne de Allan Kardec, a ampliação e a correção de seu texto não teriam sido executadas nem pelo codificador, nem com sua autorização. Essas alterações teriam sido feitas de forma deliberada, em 1872, pelo responsável por essa edição.
Simoni Privato passou a investigar os fatos, buscando provas e analisando documentos que contêm informações  esclarecedoras sobre a história do espiritismo e também sobre o conteúdo definitivo da obra A Gênese, os milagres e as predições segundo o espiritismo (La Genèse, les miracles et les prédictions selon le spiritisme).
A autora registrou o fruto das suas análises sobre os documentos originais dos registros, pedido de edição e depósito da obra — tanto da quarta, quanto da quinta edição — em seu livro O Legado de Allan Kardec. Nesse trabalho Simoni aponta fatos que sugerem que Kardec não teria realizado qualquer modificação no conteúdo de A Gênese, desde a primeira até a quarta edição e, portanto, não teria sido o autor de mais de uma centena de alterações, adições, supressões, reordenamento de parágrafos e itens detectados a partir da sua quinta edição.
O mais importante é que Simoni Privato não alimentou, em seus escritos, qualquer intenção de acusar responsáveis e sim, conforme suas próprias palavras, o desejo de que seu livro contribua para desfazer o erro histórico que tem levado tantas gerações, desde o século XIX, a lerem e a difundirem em vários países — como se fosse o definitivo — o conteúdo adulterado de “La Genèse, les miracles et les prédictions selon le spiritisme”,
sem que jamais tenham tido conhecimento do texto que Allan Kardec publicou nessa obra.
Um único móbil inspira-nos: o  respeito, o amor à verdade. Uma só ambição animanos: quereríamos, quando nosso gasto invólucro voltasse à terra, que o Espírito imortal pudesse dizer a si mesmo: minha passagem pelo mundo não terá sido estéril se contribuí para mitigar uma só dor, para esclarecer uma só inteligência em busca da verdade, para reconfortar uma só alma vacilante e contristada.
Léon Denis, Depois da Morte Miremo-nos nos exemplos dessas duas corajosas e determinadas mulheres: Thaís Montenegro Chinellato e Simoni Privato Goidanich. Elas representam o crescimento moral do qual se aproxima a humanidade, que não mais deve caminhar às cegas.
O respeito e o amor à verdade, a contribuição em busca do esclarecimento e a transparência da mensagem em direção a um novo futuro, pautaram os seus esforços.
Da mesma forma, todos devemos nos unir para que os novos pensamentos sejam despojados de ignorância e de superstição, de maneira que a luz da cultura e do sentimento não sejam vagas esperanças, mas palpáveis realidades.
O homem não caminha mais às cegas: sabe de onde vem, para onde vai e por que está na Terra. O futuro se mostra a ele na sua realidade, despojado dos preconceitos da ignorância e da superstição; não é mais uma vaga esperança: é uma verdade palpável, tão certa para ele como a sucessão dos dias e das noites.
Allan Kardec, A Gênese
Afiança-nos Allan Kardec que são chegados os tempos. Não das revoluções temporais, em que crenças pueris esperam por acontecimentos místicos, sobrenaturais, com prenúncios de ruínas das leis da natureza, mas sim, de um movimento universal em direção ao progresso moral.
A regeneração da humanidade se dará com a renovação das gerações, desembaraçadas de elementos nocivos, porém envoltas por ideias e sentimentos nobres, predominantes em mundos de níveis superiores ao planeta Terra.
Estamos preparados para esses tempos de supremacia de amor e consolação?