Perguntas que não se calam -Sidney Fernandes

PERGUNTAS QUE NÃO SE CALAM
Sidney Fernandes


Ao final de sua vida, Paul Gauguin (1848-1903), pintor francês do pós-impressionismo, passou a intitular seus quadros com suas inquietações filosóficas. A pintura considerada por ele como ponto culminante de sua obra, datada de 1897, recebeu este nome:
De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?
São questões que não se calam, formuladas por filósofos de todas as gerações, em busca da origem, do porquê e do futuro da vida. Hodiernamente, a maioria dos intelectuais, absortos em interesses materiais e absolutamente incultos em questões de espiritualidade, permanecem sem respostas.
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Dan Brown, em sua obra denominada Origem, retrata o hercúleo esforço do seu personagem Edmond Kirsch para revelar uma incrível revolução no conhecimento, com as respostas a essas fundamentais perguntas da existência humana.
Ateu e agnóstico, Kirsch era pai de uma variedade espantosa de tecnologias avançadas que representavam saltos importantes em campos diversos, como robótica, ciência do cérebro, inteligência artificial e nanotecnologia.
Abasteceu seu supercomputador de informações que sintetizaram todo o seu conhecimento espantosamente amplo da humanidade e lhe fez duas perguntas sobre a origem e o destino do homem:
De onde viemos? Para onde vamos?
E obteve a seguinte resposta:
Dados insuficientes para uma resposta exata.
— Sempre sonhei em encontrar os resultados — confessou Edmond, decepcionado, ao informar que milhões de cristãos, muçulmanos, judeus, hindus e crentes de todas as religiões acreditam que já sabem as explicações para essas grandes perguntas. Como nem todas as religiões chegam às mesmas conclusões, guerreiam-se, para decidir quais são as respostas corretas.
Argumentou o personagem que, enquanto o tempo transcorrido entre a descoberta do fogo e a invenção da roda foi de um milhão de anos, a modificação do DNA foi conquistada em duas décadas, e agora o progresso científico está sendo medido em meses, num ritmo estonteante.
Kirsch ficou irritado quando pessoas inteligentes usaram a palavra Criador, simplesmente porque não encontraram uma boa explicação para o princípio da vida. Durante todo o livro, defendeu que Deus é dispensável, e expôs uma teoria científica de como a vida poderia ter se gerado sozinha, sem a mão de Deus, dispensando, portanto, qualquer intervenção exterior. Arrogante e blasfemo, Kirsch defendeu a ideia de uma origem sem Deus, pois a vida teria surgido espontaneamente, como geração espontânea, a partir das leis da física.
Não obstante, ao final do livro, mesmo confessando-se ateu, o personagem deixou preciosa contribuição à humanidade, através do que de denominou Oração pelo Futuro:
Que nossas filosofias sigam no mesmo passo das nossas tecnologias. Que nossa compaixão siga no mesmo passo dos nossos poderes. E que o amor, e não o medo, seja o motor da mudança.
Ele também mandou uma mensagem otimista para o futuro, em que a tecnologia se tornará tão barata e disseminada que não existirão mais ricos e pobres, não faltará água, nem comida nutritiva e acesso à energia limpa para bilhões de pessoas.
Um futuro em que as doenças estarão erradicadas pela medicina genômica e em que a internet será finalmente usada para a educação, mesmo nos cantos mais remotos do mundo. As tecnologias criarão, nesse tempo, profetiza, uma abundância tão grande de recursos fundamentais, que as guerras para obtê-los não serão mais necessárias.
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O comportamento do gênio da informática Edmond Kirsch condiz perfeitamente com o que Hermínio Miranda chamou de imponente arquitetura de erudição, encontrada em pessoas cultas e bem informadas, — como cientistas, escritores, professores, artistas e líderes de toda a sorte —, nos quais, entretanto, num verdadeiro descompasso, predomina espantosa ignorância acerca da realidade espiritual.
São pessoas de excepcional talento dentro da área que dominam, muitas vezes com proveitoso trabalho e com paixões nobres, mas que se mantêm distanciadas das questões da alma, ideias de que, geralmente, não cogitam. Limitam-se a estudar e a destrinchar os enigmas apenas sob o ponto de vista superficial da matéria, sem atingir o cerne definitivo das questões, o da espiritualidade.
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O alheamento do personagem de Dan Brown às realidades póstumas e a total abstração ao que Descartes chamaria de Dualismo Psicofísico ou Dicotomia Corpo-Consciência, incitando, assim, a separação entre corpo e alma e absolutamente distante da Trindade Universal de Allan Kardec — Deus, Espírito e Princípio Material — parecem-nos, à primeira vista, muito semelhantes à análise que André Luiz faz da psicologia analítica de Freud e de seus colaboradores, no livro No Mundo Maior.
Nessa obra, o sábio instrutor de André Luiz conclui que, se, por um lado, esses estudiosos avançaram muito no campo da investigação e do conhecimento, resolvendo grandes enigmas do psiquismo humano, faltou-lhes a chave da reencarnação para solucionar integralmente as questões da alma.
Parece-nos, amigo leitor, que, nessa mesma linha de pensamentos, ao personagem de Dan Brown seria impossível resolver os milenares questionamentos da humanidade – de onde viemos, o que somos e para onde vamos — sem as noções que o Espiritismo nos traz de evolução, aperfeiçoamento, responsabilidade, reparação e eternidade.
O exame da casca não satisfaz — continua ensinando André Luiz —. É essencial atingir o cerne e determinar modificações nas causas.
Dessa forma, embora o livro Origem, de Dan Brown, seja instrutivo e atual, falta à tese defendida pelo materialista Edmond Kirsch o complemento imprescindível da realidade do reencarnacionismo e da imortalidade.
Esquecem-se, os cientistas, ao encontrarem soluções para suas perquirições materiais, nas chamadas gerações espontâneas, de se indagar como poderia um mundo, com leis físicas aleatórias e não organizadas, transformar-se em formas de vida organizadas e complexas. A existência da vida deveria levá-los a pensar na ideia de um organizador mágico, que deveríamos chamar de Criador.
Todo ser é impulsionado a criar, na organização, conservação e extensão do Universo, conclui André Luiz.
A descoberta do personagem Edmond de que as leis da física sozinhas podem criar a vida, sem dúvida pode ser considerada fascinante, mas ela suscita uma outra pergunta, que também jamais irá se calar:
Se as leis da física são tão poderosas a ponto de criar a vida...
quem criou as leis?
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À guisa de encerramento deste texto, amigo leitor, quero resgatar, parcialmente, a ideia contida em trecho do livro Os Sete Portais de Jaspe, de João Carlos Rocha, quando o personagem principal e a turma de sua classe recebem, de sua professora, a seguinte incumbência:
Deus existe? Então prove!
Cada grupo partiu para sua pesquisa, em torno de religiosos de diversas seitas, filósofos e historiadores. Os meninos procuraram trazer as diversas visões das correntes religiosas ou filosóficas, cada qual defendendo a forma de seu Deus como verdadeira.
O grupo de Jaspe trouxe algo coberto por um lençol, aparentemente um caixote, e convidou os demais colegas a ouvirem Deus. Alguns ouviram, outros não. Todos circundaram o objeto e levantaram, cuidadosamente, uma ponta do lençol da cobertura e, oh, surpresa, viram uma colmeia, na qual se podia observar o trabalho das abelhas, a forma organizada como agiam e o produto de seu trabalho.
Para encerrar o trabalho, Jaspe e seus colegas abriram uma faixa, em que estava escrita uma frase atribuída a um filósofo e escritor francês, conhecido por sua luta na defesa das liberdades civis, inclusive a liberdade religiosa:
Assombra-me o universo e eu crer procuro em vão, que haja um relógio e um relojoeiro não.
Voltaire
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Universo, obra do acaso? Impossível aceitar a ideia de que as peças de um relógio se aglutinem casualmente, saindo do caos em que se encontravam, para dar surgimento a um universo que funciona com inigualável precisão.
Kirsch, provavelmente, não cogitou de saber quem é o relojoeiro. Não cogitou de saber quem foi o autor das leis da física, que, segundo ele, seriam as responsáveis pelo surgimento da vida.
Passamos por várias fases semelhantes a essa, em toda a história da humanidade. Enfatuados de seu saber, eruditos se arvoraram em definitivos conhecedores da realidade e morreram, todos na ignorância da realidade espiritual e, provavelmente, enfrentaram, no mundo póstumo, decepções e perplexidades.
O Espiritismo é Jesus que volta a falar-nos, completando o ensino do Cristo, que exaltava a paterna figura do seu pai, Pai de todos nós. A Doutrina Espírita veio mostrar ao mundo a vida futura não como mera hipótese, mas como realidade concreta, descrita por testemunhas oculares, que voltaram do plano espiritual para contar suas histórias.
O consagrado pintor francês Paul Gauguin, se tivesse se abeberado das obras de seu compatriota Allan Kardec, não teria caminhado às cegas, e assim também os homens cultos de hoje, se pudessem também dele se aproximar, concluiriam que o Espiritismo realiza o que Jesus disse do Consolador Prometido: o conhecimento das coisas, fazendo com que o homem saiba de onde vem, para onde vai e por que está na Terra.